"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sábado, 10 de dezembro de 2011

África, berço da humanidade

Pintura nas rochas de Jabarén, no deserto do Saara, África. São reminiscências do período em que aquela região era fértil.

A mais marcante das singularidades africanas é o fato de seus povos autóctones terem sido os progenitores de todas as populações humanas do planeta, o que faz do continente africano o berço único da espécie humana. Os dados científicos que corroboram tanto as análises do DNA mitocondrial quanto os achados paleoantropológicos apontam constantemente nesse sentido.

Mulher e criança Khoisan

O continente africano, palco exclusivo dos processos interligados de hominização e de sapientização, é o único lugar do mundo onde se encontram, em perfeita sequência geológica, e acompanhados pelas indústrias líticas ou metalúrgicas correspondentes, todos os indícios da evolução da nossa espécie a partir dos primeiros ancestrais hominídeos. A humanidade, antiga e moderna, desenvolveu-se primeiro na África e logo, progressivamente e por levas sucessivas, foi povoando o planeta inteiro. Portanto, as atuais diferenças morfo-fenotípicas entre populações humanas - as chamadas "raças" - são um fenômeno recente na história da humanidade (presumivelmente do final do Paleolítico superior, 25000 a.C. - 10000 a.C.). E a ciência já descartou como anticientífica a ideia de que o morfo-fenótipo possa incidir de algum modo nos processos intelectuais de socialização ou de aquisição/aprimoramento de conhecimentos. [...]

Caçadores Khoisans

A história da espécie humana se confunde com a própria história da África, onde se originaram, também, as primeiras civilizações do mundo. Cada novo descobrimento da paleantropologia ou da antropobiologia no continente africano provoca novas ondas de choques e embates entre os cientistas, pois tais descobrimentos invalidam complexos esquemas teóricos até então tidos como definitivos, complicando ainda mais o quadro das interpretações sobre a evolução humana.

Mulher Khoisan de Botswana

As novas interpretações dos dados científicos remetem à grande complexidade do acontecer humano como um dado essencial e permanente da história. Ao mesmo tempo, geram a necessidade de realizar constantes atualizações da história do continente africano. Essa situação deve ser celebrada, pois enfraquece cada vez mais os velhos mitos e esquemas preconceituosos que chegaram até a colocar em dúvida a própria essência humana dos seres africanos. Ora, a história da humanidade começa precisamente com os primeiros seres humanos africanos, seres dotados de consciência, de sensibilidade, e não somente de inteligência.

Jovem Khoisan

Certa tradição eurocêntrica e hegemônica costuma alinhar o fato histórico com a aparição, recente, da expressão escrita, criando os infelizes conceitos de povos "com história" e de povos "sem história", que, eventualmente, o etnólogo Lucien Levy-Bruhl iria transformar em "povos lógicos" e "povos pré-lógicos". Mas a história propriamente dita é a interação consciente entre a humanidade e a natureza, por uma parte, e dos seres humanos entre si, por outra. Por conseguinte, a aparição da humanidade como espécie diferenciada no reino animal abre o período histórico. O termo "pré-história", tão abusivamente utilizado pelos especialistas das disciplinas humanas, é uma dessas criações que doravante deverão ser utilizadas com maior circunspeção.

WEDDERBURN, Carlos Moore. In: Brasil. Educação antirracista: caminhos abertos pela Lei Federal nº 10.639/03 - Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade: MEC/BID/UNESCO, 2005. p. 135-137.


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