"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Chiapas, nome de dor e de esperança

Zapatistas

O estado de Chiapas, no sudeste do México, é uma região marcada pela pobreza e violência. Em 1994, o grupo guerrilheiro autodenominado Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) tomou de surpresa seis cidades da região e declarou guerra ao governo mexicano e ao Nafta (acordo de livre comércio entre Canadá, México e Estados Unidos).

Os zapatistas, inspirados em Emiliano Zapata, herói da Revolução Mexicana (1910), afirmam lutar pela causa indígena e pela reforma agrária. A permanência de rebeldes impede a tranquilidade política do país, ao mesmo tempo que denuncia a luta de parte da população mexicana por justiça social.

Leia um trecho do artigo publicado na Folha de S. Paulo, 7 de junho de 1998, do escritor português José Saramago, que nos incita a compreender "este rio infindável de vivos e mortos, este sangue perdido, esta esperança ganha, este silêncio de quem leva séculos protestando por respeito e justiça, esta ira represada de quem finalmente se cansou de esperar".

Quando [...] as alterações introduzidas na Constituição mexicana [1992] vieram pôr termo à distribuição agrária e reduzir a nada a possibilidade de os camponeses sem terra disporem de uma parcela de terreno para cultivar, os indígenas acreditaram que poderiam defender os seus direitos [...], organizando-se em sociedades civis que se caracterizavam e assim se continuam a caracterizar, singularmente, por repudiar qualquer tipo de violência, começando pela que poderia ser a própria. Essas sociedades tiveram, desde o princípio, o apoio da Igreja católica, mas essa proteção de pouco lhes serviu. Seus dirigentes e representantes foram sucessivamente metidos na cadeia, cresceu a perseguição sistemática , implacável, brutal por parte dos poderes do Estado e dos grandes latifundiários, mancomunados à sombra dos interesses e privilégios de uns e outros, prosseguiram as ações violentas de expulsão das terras ancestrais, e as montanhas e a selva tiveram de ser, muitas vezes, o derradeiro refúgio dos deslocados. Aí, entre as névoas densas dos cimos e dos vales, iria germinar a semente da rebelião.

Os índios de Chiapas não são os únicos humilhados e ofendidos deste mundo: em todas as partes e épocas, com independência de raça, de cor, de costumes, de cultura, de crença religiosa, o ser humano que nos gabamos de ser soube sempre humilhar e ofender aqueles a quem, com triste ironia, continua a chamar seus semelhantes. Inventamos o que não existe na natureza, a crueldade, a tortura, o desprezo. Por um uso perverso da razão viemos dividindo a humanidade em categorias irredutíveis entre si, os ricos e os pobres, os senhores e os escravos, os poderosos e os débeis, os sábios e os ignorantes, e em cada uma dessas divisões fizemos divisões novas, de modo a podermos variar e multiplicar à vontade, incessantemente, os motivos para o desprezo, para a humilhação e a ofensa. [...]

NEVES, Joana. História Geral - A construção de um mundo globalizado. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 291.

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