"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Os retratos do Fayum

A Europeia. Esta jovem egípcia, com a garganta coberta por uma surpreendente rede de ouro fechada por um grande broche verde, e com seus imensos olhos negros que se desviam, exprime a melancolia de ter tão cedo deixado o mundo dos vivos. Antinoupolis, reinado de Adriano.

No oásis de Fayum, não muito longe da cidade do Cairo, são descobertos, no século XIX, túmulos datados da época da dominação romana (a partir do século I), contendo sarcófagos muito bem conservados, graças à secura do ar. A originalidade desses sarcófagos é que eles trazem o retrato do defunto, pintado com encáustica ou têmpera, sobre uma tabuleta de madeira ou uma tela de linho. Foram encontrados mais de 600, notáveis por sua qualidade artística e sua variedade. Alguns retratos foram executados por artistas populares, sem habilidade para respeitar as proporções do rosto, outros são assinados por pintores famosos. A partir de quatro cores básicas, branco, amarelo, vermelho e preto, o artista se empenha em transmitir a textura da carne, o brilho dos grandes olhos sombrios, a delicadeza dos traços, a expressão original de cada homem, mulher ou criança. A Europeia, da cor de pêssego; a Jovem com joias, penteada com tranças e anéis brilhantes; Aline, de rosto cheio; a bela Zenóbia de rosto harmonioso e olhar pensativo; os dois irmãos representados lado a lado num tondo (formato circular de pintura), conservam todo o seu frescor. A técnica de certas pinturas anuncia os ícones bizantinos ou as obras de pintores tão diferentes como Vermeer, Velásquez, Greco, Modigliani, Matisse ou Picasso.

Retrato dos dois irmãos

Retrato de um menino

Efebos sensuais, militares barbudos, encantadoras jovens, mulheres orgulhosas por exibir suas joias, matronas cansadas, crianças desaparecidas demasiado cedo, toda a sociedade do Egito romano é ressuscitada graças a essa surpreendente galeria de retratos, única em seu gênero, associando a prática egípcia do sarcófago à arte romana do retrato.

SALLES, Catherine [dir.]. Larousse das civilizações antigas 3: das bacanais à Ravena. São Paulo: Larousse do Brasil, 2008. p. 282-283.

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