"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

segunda-feira, 16 de março de 2015

Panorama político-econômico e movimentos populares no Império

De 1850 em diante o Brasil passou a viver um processo de transformações no plano econômico que teve suas ligações no plano político. Foi nesse momento que o novo setor da classe dominante, mais progressista e responsável pelas transformações, iniciou a luta política na defesa de seus interesses.

A fase denominada de Segundo Reinado foi marcada justamente pela luta entre o grupo conservador e o grupo progressista afinado com o capitalismo. Dessa forma, ia-se travando o embate político em que o setor escravista, em decorrência do fim do tráfico negreiro, via crescer suas dificuldades de revigoramento em virtude da escassez de mão-de-obra, cujo preço de compra não cessou de aumentar.

[...] O aumento da demanda de escravo, advindo da expansão da lavoura, agiu também como fator de elevação do seu preço.

Em consequência, criou-se um problema para as regiões que se encontravam em decadência econômica, pois o trabalho escravo inibia possíveis correntes migratórias de trabalhadores assalariados para essas regiões. Além disso, o reduzido número de escravos não era capaz de satisfazer às necessidades econômicas dessas regiões. Em decorrência, houve uma liberação da mão-de-obra escrava através do tráfico interno, para regiões que se encontravam em desenvolvimento, bem como pela abolição, como foi o caso do Ceará, que libertou seus escravos em 1884.

Escravos numa fazenda de café, Marc Ferrez

A introdução da usina na produção de açúcar marcou a tentativa de recuperação da economia nordestina, que passou a ser dotada de um alto nível de produção em escala industrial. Porém, tal inovação logo foi esvaziada pelo capital internacional, que passou a controlar esse tipo de produção.

Na Região Amazônica, devido à produção de borracha, passava-se a utilizar o trabalho assalariado, pois a mão-de-obra escrava era incompatível com tal atividade. A principal característica da exploração do trabalhador nos seringais era a dependência excessiva em que ficava em relação ao patrão, visto que o grande proprietário era o dono de todos os instrumentos na extração do látex. A má remuneração que o trabalhador recebia levou-o a enorme dependência, pois a única possibilidade de conseguir o necessário para sua sobrevivência restringia-se ao pequeno mercado existente dentro dos limites onde trabalhava. [...]

O Império não se alinhava às transformações que se processavam no plano econômico. Tendo como principal base de sustentação política a classe de proprietários de escravos, viu crescer a oposição até mesmo entre seus mais próximos aliados, como aconteceu com a Questão Religiosa que colocou em choque setores da Igreja e o governo. Já a Questão Militar acabou levando o Clube Militar a afirmar que o Exército não mais se envolveria na procura de escravos fugidos.

[...] Em 1872 foi fundado o Partido Republicano Paulista [...]. O Império se enfraquecia sem o apoio inclusive da classe média, personificada nos militares, profissionais liberais, funcionários públicos e clérigos.

[...] Para agravar os problemas, o governo imperial contava ainda com dificuldades econômicas e de abastecimento interno, pois a produção brasileira priorizava o cultivo de produtos primários para exportação [...].

A burguesia comercial, que se encontrava composta em sua grande maioria por portugueses, era a grande beneficiada com tal situação econômica, já que o país não se limitava a comprar somente artigos supérfluos, mas, também, gêneros alimentícios. [...]

O quadro econômico do país foi uma sucessão de déficits orçamentários que perduraram até a década de 1880, gerando, em consequência, uma situação inflacionária. O aumento das emissões de moedas, aliado aos empréstimos externos, colocou as classes não proprietárias em posição cada vez mais delicada, pois a miséria se generalizava.

[...]

A proclamação da República foi o último golpe desferido contra o Império. Sem sombra de dúvida, significativas parcelas dos segmentos médios urbanos, cujo setor militar assumiu papel preponderante, incorporaram a ideologia republicana, favorecendo a desarticulação das bases de sustentação política do regime monárquico. [...]

[...]

Família pobre da Província do Ceará, Fotógrafo desconhecido

[...] lutas sociais violentas ocorreram, refletindo o descontentamento de grupos ou camadas sociais contra a opressão das classes dirigentes:

"Tudo era motivo para revolta e atos de violência. Nas principais cidades, de tempos em tempos, ocorriam motins populares. As decisões governamentais que não tinham apoio ou compreensão popular não eram acatadas. A população revoltava-se contra o registro civil dos nascimentos e óbitos, contra o censo geral da população do Império, contra a aplicação dos novos padrões de pesos e medidas etc. Não realizava simples passeatas de protestos, mas autênticas lutas com mortos e feridos. Além disso, desde a Praieira (1848-1850), havia uma animosidade latente entre grandes proprietários e trabalhadores rurais. A tudo isto somava-se a atuação da imprensa e dos políticos radicais, bem como a luta entre facções da elite, disputando o controle das funções públicas. A difícil situação da economia regional ocasionava o rompimento da precária paz entre as classes sociais, e entre estas e o Estado monárquico. As insurreições, conflitos e violência demonstravam a profundidade das contradições econômicas [...]." (MONTEIRO, Hamilton de Mattos. Nordeste Insurgente (1850-1890). São Paulo: Brasiliense, 1981. p. 30. Coleção Tudo é História)

AQUINO, Rubim Santos Leão de [et al.]. Sociedade brasileira: uma história através dos movimentos sociais: da crise do escravismo ao apogeu do neoliberalismo. Rio de Janeiro: Record, 2011. p. 20-24.

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