"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Cuecas e calcinhas

Qual é a primeira peça de roupa que você veste todos os dias? Com certeza a calcinha. Ou a cueca. Peças íntimas são tão comuns hoje que é quase impossível imaginar que há pouco tempo mulheres saíam de casa sem nada por baixo da saia. Quando vestiam alguma coisa, eram peças largas, feitas de um tecido fino e que, no Brasil, ficaram conhecidas como anáguas.

Mosaico romano mostrando duas mulheres vestindo "calcinha" e "sutiã". Artistas desconhecidos

As roupas femininas íntimas ajustadas ao corpo, como conhecemos hoje, são um invento bastante recente e, mesmo depois de terem sido inventadas, não eram usadas por todo mundo. Nos anos 1700, por exemplo, calcinhas eram consideradas vestes de prostitutas e atrizes (palavras que, na época, eram quase sinônimos). O máximo que mulheres de bem usavam era uma espécie de calça que ficou conhecida como culote - era como uma calça cigarrete, só que larga na parte de cima e justa apenas nas pernas.

Já a cueca é um costume bastante antigo. Os homens do tempo das cavernas já usavam uma espécie de fralda, feita de tecido ou couro, para proteger as partes íntimas. Tribos africanas ou indígenas tinham uma outra maneira de esconder o pênis: enrolavam-no com um pedaço de tecido, até que ele tivesse completamente coberto. Até hoje, algumas tribos usam enfeites penianos como cueca. É o caso dos zo'és, uma tribo de índios da Amazônia que não aparece em público de jeito nenhum se não estiver usando o seu adereço.

São Domingos presidindo um Auto de fé (detalhe), Pedro Berruguette. Sacristia da Igreja de Santo Tomás, Ávila, ca. 1495

No ano 1300, os cavaleiros tiveram de abusar das cuecas. É que o uniforme da época eram as armaduras de metal e só um bom pedaço de linho amarrado entre as pernas e na cintura salvava-os da dor de ter o pênis encostando naquela armação de ferro durante uma batalha. Nessa época, cuecas eram tão importantes que muitas vezes apareciam por cima da roupa, demarcando a genitália. Nesse caso, elas incluíam até mesmo algum tipo de sistema abre e fecha. Assim, quando batia a vontade de ir ao banheiro, os homens não precisavam tirar toda a roupa para se aliviar. Bastava abrir o botãozinho da cueca exterior.

Com o tempo, tanto exibicionismo saiu de moda e os homens (principalmente os que viviam em países frios) trocaram os pequenos pedaços de pano pelos "macacões de meia", um macacão feito com um algodão fininho, que cobria todo o corpo.

No Brasil, que era bastante quente, a moda era a ceroula, uma cueca que ia da cintura até o tornozelo. Tanto o macacão quanto a ceroula ajudavam a esquentar e impediam que o suor do corpo chegasse às roupas - que não eram lavadas com tanta frequência. Essas peças íntimas também serviam para proteger a pele, já que os tecidos das roupas não eram tão macios quanto os de hoje.

Ou seja, até 1930 mais ou menos, qualquer roupa íntima tinha apenas um propósito: ser útil. Hoje, isso mudou. Calcinhas e cuecas passaram a ser vistas como um item de moda e procuram mostrar um pouco a personalidade da pessoa que as escolhe. Opção é o que não falta.

SOALHEIRO, Bárbara. Como fazíamos sem... São Paulo: Panda Books, 2010. p. 72, 74-75.

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