"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

segunda-feira, 11 de julho de 2016

"O viver em colônias" [Parte 8 - O fisco e os monopólios / A cultura da evasão fiscal]

* O fisco e os monopólios. A manutenção da burocracia - civil, militar e eclesiástica - provou ser o mais pesado dos fardos carregados pelos colonos ao longo de séculos. Além de pagar o dízimo, os habitantes da colônia arcavam com o oneroso sistema de contrato-monopólio que incidia sobre certos artigos - sal, aguardente de cana, vinho, azeite, óleo de baleia, tabaco, escravos, entre outros. O fornecimento desses gêneros e a arrecadação dos impostos devidos eram arrematados pela Coroa a particulares.

Esses agentes exploravam a comercialização de tais produtos em troca de uma quantia fixa paga antecipadamente à Coroa. O mesmo acontecia com vários impostos: em vez de cobrá-los diretamente, a Coroa arrendava a cobrança, em troca de uma cifra predeterminada em contrato. os contratadores "financiavam", de certa forma, a Coroa. A população colonial foi, muitas vezes, vítima dos abusos cometidos por contratadores de monopólios. Disso resultava o encarecimento dos produtos e o empobrecimento dos habitantes da colônia.

Além disso, a Coroa ainda lançava mão das alfândegas, estabelecidas nos principais portos do Brasil, onde todos os produtos importados pela colônia pagavam impostos; e, também, todos os produtos embarcados nos portos coloniais. Além das alfândegas, havia as "entradas", os pedágios sobre estradas e pontes.

Esse sistema de cobrança de impostos foi um dos maiores flagelos da população colonial. As alfândegas tornavam os produtos mais caros. O dízimo, cobrado em dinheiro, reduzia a já escassa quantidade de moeda circulante. Além disso, o sistema de monopólio proibia a produção independente daqueles gêneros que apenas a Coroa poderia prover. O sal não podia ser produzido localmente - isso provocou, em 1711, uma rebelião em Salvador, a revolta do Maneta. Era obrigatório comprar o sal dos contratadores da Coroa. A aguardente de cana não podia ser vendida no mercado interno, para não prejudicar o vinho importado pelos contratadores da Coroa. A produção de manufaturas estava expressamente proibida. A Coroa reservava-se o monopólio do fornecimento de manufaturas de ferro e de tecidos.


Um funcionário do governo a passeio com sua família, Jean-Baptiste Debret

* A cultura da evasão fiscal. A contrapartida foi o contrabando, que contava com a solicita venalidade dos funcionários encarregados de supervisionar as atividades comerciais. Raro foi o burocrata que não participou de algum ilícito comercial para compensar os baixos salários pagos pela Coroa.

Fraudava-se o fisco sempre que possível. Ao longo do século, o comércio de contrabando foi assumindo proporções incontroláveis e, no fim do século XVIII. um complexo sistema de evasão fiscal desviava recursos, em volumes significativos, regularmente, dos cofres da monarquia.

Em Ajudá, no litoral africano, o intenso comércio de contrabando realizado pelos negreiros baianos chegou a provocar reações por parte da Coroa, que, para evitar a perda de recursos devidos ao tesouro, ameaçou proibir o comércio legal.

MOTA, Carlos Guilherme; LOPEZ, Adriana. História do Brasil: uma interpretação. São Paulo: Editora 34, 2015. p. 240-1.

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