"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

O sexo das mulheres: a virgindade (Parte 2)

Fantasia, Antônio Parreiras 

O sexo das mulheres deve ser protegido, fechado e possuído. Daí a importância atribuída ao hímen e à virgindade. Principalmente pelo cristianismo, que faz da castidade e do celibato um estado superior. Para os Pais da Igreja, a carne é fraca. O pecado da carne é o mais terrível dos pecados. [...]

A virgindade é um valor supremo para as mulheres e principalmente para as moças. A Virgem Maria, em oposição a Maria Madalena, é seu modelo e protetora. Ela é, ao mesmo tempo, concebida sem pecado (dogma da Imaculada Conceição, Pio IX, em 1854) e concebe sem o homem, "pela intervenção do Espírito Santo". A Virgem, entretanto, é mãe em toda plenitude; ela carrega seu filho no ventre, o alimenta, o segue em suas predicações, o sustenta em sua paixão, o assiste em sua morte: a mãe perfeita, mas somente mãe. A Virgem é rainha e mãe da Igreja medieval, mediadora, protetora. "No século XIII, Deus mudou de sexo", escreve Michelet. As virgens das catedrais e das igrejas transmitem essa presença pacificadora, mas também obsedante, de Maria, rainha dos conventos, patrona das moças.

A fonte, Ingres

Filhas de Maria, elas são sujeitas à pureza. O pudor é o seu ornamento. A virgindade no casamento é seu capital mais precioso. Elas devem se defender da sedução e do estupro, que, entretanto, é praticado por bandos de jovens em busca de iniciação. Moças sozinhas à noite precisam ter cuidado. Não estão mais protegidas do que as mulheres na cidade noturna moderna. O corpo das mulheres está em perigo.

A virgindade das moças pertence aos homens que a cobiçam. Mais mito do que realidade, o direito do senhor feudal de deflorar a mulher do servo não deixa de ser rico de significações. O direito do esposo é mais real, pois se apodera de sua mulher na noite de núpcias, verdadeiro rito de tomada de posse. Ritual que, por muito tempo, era público (a verificação do lençol manchado que sobrevive na África do Norte), tornou-se cada vez mais íntimo. Principalmente a partir dos séculos XVIII e XIX, como o mostra a prática da viagem de núpcias.

PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. São Paulo: Contexto, 2013. p. 64-5.

Nenhum comentário:

Postar um comentário